Criatividade e UX/UI: Da estrutura à liberdade



O Marco é Creative & Motion Designer na Affinity. Mestre…
Quando falamos em criação de elementos visuais ou mesmo em design em geral, a ideia que existe é de que este é um processo livre, quase anarquista, sem regras. Existe, nesta área, quase um encorajamento para esse desafiar e quebrar regras, um caminho que me parece natural numa área onde a criatividade é tão importante. Sem liberdade, como teríamos a capacidade de ser criativos?
No mundo digital, no espaço web, se estivéssemos limitados aos mesmos estilos e às mesmas regras desde o princípio, não teria havido qualquer evolução que despertasse interesse nos utilizadores em experimentar novos sites, novas aplicações e mesmo novos produtos ou serviços.
“There is no doubt that creativity is the most important human resource of all. Without creativity, there would be no progress, and we would be forever repeating the same patterns.”
Neste sentido, a palavra “regra” pode ser demasiado pesada para o universo do design mas nada disto significa que a “liberdade total” é a chave para o sucesso. A criatividade não é nada mais do que um pensamento gerado a partir das nossas experiências, de coisas que observamos anteriormente. O propósito do Design não é tornar as coisas bonitas. O objetivo do design é comunicar algo, ou guiar para algo. Está muito mais ligado a um plano/estratégia do que até a própria estética. É por isso que também é um trabalho que nunca termina (é preciso muita paciência), porque os objetivos mudam, as pessoas mudam, e o design tem que acompanhar e muitas vezes até impulsionar essa mudança.
Neste sentido, no caso específico do UX & UI, o nosso objetivo é guiar o utilizador a fazer aquilo que queremos, dentro do nosso site ou aplicação. O design é no fundo aquilo que torna a experiência mais fácil e satisfatória para o utilizador e que claro, seja concluída com a ação que a nossa empresa ou marca deseja. Isto significa que uma “liberdade total” no processo também não faz sentido. Cada projeto tem sempre um objetivo e o trabalho de design é guiar o utilizador a chegar a esse nosso propósito.
Por isso, e apesar de não estarmos limitados a “regras” no processo, existem estratégias e princípios que nos ajudam a construir, ou pelo menos avaliar se estamos a fazer bem o nosso trabalho. Com elas podemos aumentar as possibilidades de sucesso das nossas interfaces sem sabotar qualquer liberdade na criatividade.
Jacob Nielsen, que é considerado “o rei da usabilidade” e “o guru do design e usabilidade mais conhecido da Internet” identificou 10 princípios para o design de interação. Estes princípios são gerais e aplicáveis em qualquer design de interação, seja ele digital ou até de um produto físico como por exemplo uma máquina de lavar loiça. Vou apresentar todos estes com algumas ilustrações para tentar facilitar a compreensão do seu uso em contexto digital.
1. Informar o estado do sistema
O utilizador tem sempre que saber onde está e o que está a acontecer na plataforma que está a usar. Para isso, o design precisa de dar feedback constante sobre todas as ações que acontecem.

Quando um site nos dá esse feedback sobre o que estamos a fazer, podemos planear melhor as ações futuras tendo em conta o que aprendemos nas ações anteriores. O feedback ajuda-nos a compreender como qualquer ferramenta funciona dando confiança a qualquer utilizador.
2. Usar a linguagem do utilizador
Todas as informações presentes numa aplicação devem ser orientadas tendo em conta o modelo mental do utilizador. Isto é, quando usamos uma aplicação, temos que entender o significado dos elementos que nos são apresentados sem termos que fazer uma pesquisa. Para isto acontecer, o designer tem que estudar muito bem o tipo de utilizador e entender de quer forma consegue comunicar na “linguagem” dele.

3. Liberdade e Controlo do utilizador
É normal que existam ações por engano ao utilizar uma aplicação ou website. Por isso, deve ser sempre possível desfazer, ou simplesmente voltar atrás na ação. Isto vai promover uma sensação de liberdade e proporcionar a confiança que queremos, evitando qualquer frustração por parte do utilizador.

4. Consistência e Standards
No mundo digital todos nós utilizamos várias ferramentas, aplicações ou sites e desde a primeira vez que os aprendemos a usar, retivemos essas experiências na nossa memória. No caso específico de uma loja online, todos nós já sabemos como funcionam, em que posições estão os botões e as ações que vamos exercer para comprar um produto. Isso cria em nós, os utilizadores, uma expectativa. Se entrarmos numa loja online e encontrarmos um formato completamente novo, sentimo-nos forçados a aprender algo novo aumentando a nossa carga cognitiva.
Isto não implica que temos que “copiar” o standard das lojas mais visitadas do mundo, apenas indica que devemos ter esta questão em consideração, usando-a a nosso favor, colocando os elementos em sítios que o utilizador vai reconhecer e interagir com mais facilidade.

5. Prevenção do erro
Erros acontecem, mas um dos maiores trabalhos de um designer é essencialmente prevenir que eles aconteçam.
Jacob Nielsen apresenta-nos dois tipos de erros: deslizes e enganos. Os deslizes são erros de desatenção, enquanto os enganos são erros conscientes que surgem devido a uma incompatibilidade entre o design e o modelo mental do utilizador. O ponto anterior da consistência e standards é um bom exemplo de como agir para prevenir estes erros de desatenção ou de engano, porque se o nosso design estiver consistente comparado com o resto do mercado, podemos evitar sobrecarga cognitiva e deslizes. Para além disto, é claro que o ponto do controlo do utilizador também é imprescindível porque temos sempre que poder voltar atrás ou refazer uma ação, depois de um erro.

6. Reconhecer em vez de recordar
Ainda com foco em minimizar a carga cognitiva do utilizador, devemos manter os elementos e a opções mais importantes sempre visíveis em qualquer página da nossa interface. O menu é um dos exemplos mais claros disso, sendo que podemos ver que os sites e aplicações por norma mantêm-no sempre visível e/ou alcançável em qualquer página, para que o utilizador possa realizar várias ações e navegar facilmente entre diferentes secções.
7. Eficiência e flexibilidade do sistema
Em aplicações/ferramentas mais complexas é fundamental ajudar um novo utilizador sem qualquer experiência, mas também, nunca esquecer de facilitar e tornar mais rápida possível a experiência de um utilizador experiente, que já tem grande conhecimento da plataforma. Este último, fica a ganhar se tiver atalhos que tornem a sua experiência mais eficiente possível. A ideia é a de que estes utilizadores mais novatos ou experientes possam também “escolher” personalizar o seu ambiente para fazer mais ou fazer menos.
8. Design estético e minimalista
Qualquer interface deve conter apenas informações relevantes e necessárias para o utilizador, ou pelo menos, elas devem estar sempre mais evidenciadas do que qualquer outra unidade extra de informação.
O visual da interface do utilizador (UI) deve dar foco ao essencial. Os utilizadores não podem ficar distraídos com elementos que não precisam. É necessário priorizar todos os recursos e conteúdos que levem o utilizador ao seu objetivo.

9. Ajudar utilizadores a resolver e entender os erros
No ponto ‘1. Informar o estado do sistema’ abordámos a grande necessidade de dar feedback ao utilizador sobre tudo o que está a acontecer e neste caso, a questão dos erros leva-nos à necessidade não só de comunicar, como também explicar o que aconteceu e como se pode resolver. Oferecer uma solução é mesmo muito importante. Deve haver um foco especial em apresentar os erros visualmente de forma que o utilizador o reconheça.
A mensagem deve ter uma linguagem clara, colocando as questões técnicas do erro de forma mais minimal, para que os utilizadores mais avançados possam explorar melhor o diagnóstico do erro se assim o quiserem.
10. Ajuda e documentação
Num mundo perfeito, o melhor é nunca ser necessária qualquer explicação adicional. Ainda assim, é bom que exista um espaço dedicado apenas a ajudar o utilizador a entender como funciona o sistema. Quando esta documentação existe, o próprio utilizador também ganha mais confiança no sistema que está a usar.
Estes princípios de Jacob Nielsen sofreram algumas atualizações nas explicações e/ou exemplos, mas a sua base e o fundamento principal de cada uma deles continua igual desde 1994. Quase 30 anos depois, todos eles continuam atuais e aplicáveis em vários contextos do design de interação.
Podemos aplicar todos estes princípios no nosso UX & UI Design para aumentar as possibilidades de sucesso da nossa aplicação ou site! No entanto, estes devem ser encarados como uma “ferramenta” a nosso favor, uma “fórmula” que nos pode guiar para que o nosso trabalho resulte da melhor forma. A partir daí, cabe ao designer colocar o melhor de si, usar a sua criatividade e experiências no sentido de se diferenciar. O segredo? Tentar, tentar e tentar outra vez! Os mais criativos são aqueles que tentam, falham e voltam a tentar, até que conseguem alcançar algo novo, diferente e inovador!
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O Marco é Creative & Motion Designer na Affinity. Mestre da comunicação multimédia, as competências do Marco vão do design gráfico ao motion, do UI/UX design ao Frontend passando pela produção de vídeo. Este último é na verdade a grande paixão do Marco, que arrasa com a câmara qual Christopher Nolan!